domingo, 30 de novembro de 2014

Sobre o que acho de Deus!



Sobre o que acho de Deus? Tenho pavor, medo de estar sendo espiado em todos os cantos  onde estou.

Penso N´Ele com receio de que esteja sempre a usar seu chicote de raios em minhas costas, cortando a carne que já sofre porque talvez não seja merecedor do seu amor.

Mas, peco...escondo os Dez Mandamentos na gaveta e caio nos pecados do mundo, do egoísmo, da inveja, do querer o do outro e o outro também.

Mesmo assim nossa relação é saudável, porque Ele sabe que sou seu filho e sou imperfeito e que a cada escorregada não peço perdão, meço bem minhas palavras meus atos e me redimo sinceramente e procuro me consertar até outro escorregão.

Vejo Deus em tudo, na natureza, nos bichos, no espaço e no tempo. Tenho tempo para Ele e ultimamente temos caminhado muito juntinhos, Ele sempre do meu lado esquerdo e me dando a mão.

No entanto, não consigo ve-Lo no outro, porque sei quão imperfeito sou e portanto não é no outro que vou encontra-Lo, posso no máximo vislumbra-Lo em uma ação...mas, nada disso é medido assim.

Seu doce filho morreu inutilmente, deveria ter aproveitado mais a vida, uns finais de semana no Mar Morto, uma bebedeirazinha...o ser humano continua pérfido, egoísta e destrutivo. Não valeu a pena.

Tudo bem eu entendo que Ele sabe o que faz.

Não me interessa saber absolutamente o que pensam todos, de qualquer religião. Mazelas trazidas por elas permanecem.

Tenho ampla e total devoção!

Ouço Deus!

Olho sempre para cima quando preciso D´Ele. Torcicolos permanentes.

Não O desafio, perderia com certeza, é desse medo que falo...do errar, do se prostrar, do achar que somente eu seja suficiente.

Não sou!

Luz de todos os meus caminhos, abrigo de todas as minhas dores, carinho de pai para um filho doente, permanente em mim.

Eu O sinto!

Sem diálogo, sem monólogo, sem prólogo...sem fim.

Uma cronica urbana!



Ele estava acordado, mas não havia feito nada de produtivo além de tentar ler, orar, pensar, refletir e se angustiar, uma mania incrivelmente idiota de tentar esconder sua ansiedade.

Se levantou e foi para a janela, mesmo cedo ele já sabia que o movimento de pessoas lá embaixo na avenida já era grande, era uma avenida interessante, porque era larga, bonita e o levava direto à estação do metrô.

Ficou ali pensando um instante, com aquela sensação de soco na boca do estômago e que ele sentia todos os dias, todo santo dia, todo dia e durante o dia, só passava quando fechava sua máquina e pegava o caminho de volta para casa. Esse era o preço que estava pagando por tudo, pela mudança de sua cidade do interior para uma cidade grande, pela função desumana que exercia, pelo excesso de responsabilidade e mais do que isso o eterno e grudento medo de falhar sempre.

Saiu da janela e foi se aprontar, era lento, não para acordar ou para estar alerta ia e voltava do quarto para o banheiro inúmeras vezes, o mais engraçado era que quando se juntava a aquela multidão que ele observava lá de cima, quando ele realmente estava ali a dor de soco na boca do estomago passava, por um simples motivo...pessoas, ele achava tudo absolutamente interessante, olhava todo mundo, o da esquerda, o da direita, o que estava a sua frente e também dava várias olhadas para quem estava vindo atrás de seus passos. Isso o abstraia de imediato e profundamente, quando entrava no vagão do metrô era uma delícia, nunca se sentava e era como se observar as pessoas de pé fosse dado a ele um pequeno poder de observação ainda mais profundo. Primeiro se perdia no rosto, se eram bonitas ou não e começava a se questionar sobre beleza, o vestuário e depois caia na ridícula tentação de adivinhar a alma do ocupante alvo de sua interpretação, e ali permanecia de forma a se aprimorar, exatamente em quê? Ele não sabia.

Já fazia parte daquela cidade por mais que negasse e por mais que quisesse voltar para sua pequena terra natal, seu coração era sempre eternamente dividido, cortado como pedaços de maçã onde cada parte tinha uma historinha, alguns pedaços já bem oxidados e que ele se sentia muito confuso em jogar esse pedaço fora ou jogar fora.

Tinha a seu favor uma força descomunal de trabalho, se empenhava, se desgastava e se sentia aliviado de retornar para casa que lhe era reconfortante mesmo sabendo que podia haver outras armadilhas no dia seguinte.

Não bebia, queria isso...mas, se segurava no impulso e achava que viraria um alcoolatra, a solidão que permanecia em si talvez pudesse leva-lo a esse caminho, e fazia aquele balanço do dia nada imparcial, pensava em tudo e em todos, despejava em uma bacia tudo e muitas vezes deixava essa bacia vazia depois de chuta-la com força no canto de suas decisões.

Se apaziguava, e sabia do seu antídoto...conversar, jogar papo fora, pegava o telefone e ligava para seu amor sempre com um sorriso no rosto só de ouvir a voz lá do outro lado...e de alguns amigos também, poucos, poucos quase se extinguindo.

Acabou assim, dormindo no sofá, dor na cabeça e depois se arrastando para cama pesado de sono e sem conseguir dormir.

Esse fardo pesado, esse corredor descomunal que não acabava nunca e que ele sentia como o principal cômodo da sua casa e da sua vida...era sempre um pesadelo.

Outros dias, outros metrôs, outros knock-outs no estomago, se entregou...voltou para sua cidade no interior e se apagou.

Viveu mais alguns anos, revendo os extintos amigos com abraços já pela metade, foi vivendo calmamente, o estomago costurado e a alma esparadrapada circulando pela pequena cidade procurando a estação do metrô.




Carta para uma irmã. Do Oriente!



Cheguei ao meu destino, bem longe, muito longe de onde deveria estar, no Oriente, não sei ainda me situar, se isso é bonito ou feio, cheguei agora e caminho pelas ruas...não vejo ninguém a quem possa dizer um oi, ou dar um aceno e um sorriso de boa vontade. Nada, nem ninguém me olha apesar de ser aqui um ser diferente de tom de pele ou mesmo com meus cabelos grisalhos e escassos. Estou cansado a viagem foi longa. Penso em você minha irmã querida, que troca comigo ideias de literatura e outras tantas opiniões que as temos aos montes, apesar de que você fala muito mais do que eu, que sou calado e bom ouvinte.

Essas viagens constantes me esgotam, por um motivo muito simples nunca me adequo a nada, apesar de olhar outros lugares com muito bons olhos e achar tudo muito atraente, mesmo, que a pobreza de onde estou é tão gritante que isso me entristece muito.

Outras impressões vão se acumulando e vou procurar a todo instante capta-las, quando voltar serei eu o falante, já vejo seus olhos castanhos brilhantes a imaginar...o quão distante o Oriente está.

Guarde para minha volta seus contos, suas reinações e não se esqueça, no Oriente falo seu nome e peço tradução.

Não existe, ele sempre é Elizabete.

Carta para meus filhos!



Estou a caminho, estou a caminho, estou a caminho...sei que está todo de branco e tocará flauta para mim, estou ansioso para te ouvir. Fui ver sua irmã dançar em outro lugar, passos de jazz, corri com sua irmã ela está treinando nos patins, vou chegar, vou chegar, vou chegar...o folego já me falta. Vou chegar.

Minha presença, permeou nossas vidas...minha ausência sufocou nossas risadas, minhas dores cicatrizaram pela raíz.

Eu passei longo tempo viajando, colhendo os frutos de uma árvore que não parava de crescer e me enrolar em seus galhos, desafios a todo instante, errando e aprendendo, ensinando, divagando e devagar compreender.

Nossas cartas se rarearam, vocês cresceram, não ouço mais a flautinha tocar, os passos de jazz desesperados, só os patins encostados atrás da porta da cozinha.

Sua varinha mágica está guardada, seu lanterna verde na estante, suas bonecas guardadas e bichinhos de pelúcia no fundo do armário.

Onde eu estava, o que eu perdi? O que é essa dor que sinto lá no fundo que me faz mentir para mim mesmo...eu consegui.

Nada, não cheguei a tempo, eu perdi o brinquedo no meio do caminho...eu corri, corri muito, mais do que podia, eu ia chegar. Não cheguei.

Meus filhos, que brotaram mais do meu peito do que das minhas entranhas, que permanecem mais no meu pensamento do que minha própria fome...não me enganei. Vou chegar, custe o que custar, que o mundo dê suas voltas e deslizadas no corrimão da escada que muitas vezes desabei...eu vou estar lá.

Me esperem, me encontrem no final, no final da escada...mesmo desabado, descabelado, cansado eu vou me levantar e olhar cada um nos olhos e cantar as canções que escolhi para  vocês.

Um beijo, amo vocês...já comprei os selos, hoje mesmo coloco essa carta no correio e ela vai pesada, mais de toneladas de amor.

Prometo!!!

Eu vou chegar!!!


sábado, 15 de novembro de 2014

Do Eu...e do Inverso



Gosto do complexo, do ininteligível, do preto e do cinza
Das rimas não ritmadas, não batidas, nem sequenciais
Gosto da rudeza das palavras e da lembrança distorcida
Gosto de me ver e me admirar através do vitral, disforme
Do real e da ficção, do emprestado e não tomado...
Gosto de não ser entendido
Da destreza da Bossa ao conjunto de notas soltas e juntas do Jazz
Da língua difícil, do animo comprido e da languidez encurtada
Do Universo encolhido ao desejo infinito e profundo
Gosto, gosto de ter gente por perto e me recolher à solidão
Pudera eu começar a me inverter
Ser menos sentido e mais viver
Simples e atingível, tocável e mais raso
Gosto da matemática simples e relativa
Do samba e do xote, desmontar e montar notas
Fingir dançar baião...
Impressionar por ser mudo mais do que falar tudo
Gosto de ter sonhos mais do que ter fome
Fingir cantar axé...
Traçar retas tão tortas que muitas curvas têm
Gosto de andar a pé olhando para o chão
Simples...como qualquer um olhando o dedão
Gosto de olhar para os pés
Zero...pouco mais de um, de dois...
De nada!