quarta-feira, 20 de julho de 2016

Toda forma de amor!

Toda forma de amor!

Vale a pena, mas, não o vale em que ele nos atira, insuficiente de razões, de complexidades e contornos, retornos e destroços.

Uma deliciosa vertigem de quem cai, se esborracha e alcança o supra sumo da independência. Quero isso pra mim.

Viver amores, tolido, tolindo, chorando ou sorrindo vale a pena, com certeza a rotina do mal estar pode derrubar a porta da paz...paz que não ignora o desejo, de estar de ser e de completar. O ego viaja, mas, nunca sai a passeio...fica sempre atento a querer te engolir.

Sensações de extremo, excesso de peso, ou leveza da ansia de querer algo mais que está entrelinhas, devagar e rompendo tudo como se fosse uma pinga envelhecida em carvalho...da velha Minas Gerais.

Outro passo, e outro tropeço, outro passo e outro desassossego, outro compasso e outro solo de duas almas, que se querem...se possuem uma querendo engolir a outra. Ilusão.

Ilusão, de nada poder conter a ilusão da sensação de soltura que estou sentindo, me permitindo amar a mim mesmo como nunca. Uma sensação de liberdade acompanhada de sim...agora já me libertei e sou somente uma nuvem nesse céu que azul está...atrás da minha nuvem.

Uma decisão igual, uma possibilidade de seguir me frente, de sobreviver, de mergulhar e respirar tanto quanto se pode. Uma imersão e uma subida tão veloz quanto a vontade de amar.

Vale a pena!

Somos mais que inteiros, somos mais que duas metades, somos mais que crime de Lesa Majestade, somos um híbrido.

Imperfeição daqueles que querem sugar nossa luz como buraco negro.

Não vale a pena!

Virada de mesa, jogatina besta, incerteza do ganho e do lucro, só uma parte pode se apropriar, a outra só observa...no entanto não há ganhadores.

Continua a paz querida, almejada e lograda como se possuísse por sí só um esquadro que não desenha nada a não ser o seu conceito tão raso em dias de puro egoísmo.

Vamos lá, eu já estou em paz...faz tempo, e qualquer forma de amor vale a pena!

Só se for feliz!

terça-feira, 12 de abril de 2016

02 de Novembro!



02 DE NOVEMBRO!

Hoje fui visita-los, me senti como se existisse realmente um muro elevado de pedra, tal qual Muralha da China ou o Muro das Lamentações que se divide com a Mesquita Al-Aqsa. Uma garoa gostosa amainava minha vontade de permanecer ali, logo eu que nunca fui chegado a essas visitas.
Senti saudades, muitas saudades, senti saudade até de quem eu nunca conheci ou não tenho recordações a não ser o seu sagrado caderno de desenhos, que para mim era sim um santuário de beleza, cheiro e recordações que nunca poderia existir, mas havia.
E tudo tão obscuro e a mente acelerada, o coração sentindo vazios e me lembrei de uma música da Angela Ro Ro e Cazuza...Cobaias de Deus.
Me senti assim, em um laboratório...em um labirinto. Um monte de perguntas sem respostas e eu sempre perguntando, elevo meus pensamentos e penso no café da manhã, tão elevado esse pensamento, me senti novamente humano uma cobaia branquela de Deus.
Naturalmente e como sempre me preencho e me esvazio, vou tocando a vida entre os labirintos e as permissões de ir, voltar nunca.
Flores artificiais, flores artificiais, artifícios de flores...
Artifícios sem fogos, cera derretendo, saudade permanecendo e flores artificiais.
Tudo misturado com a garoa, com as cobaias perdidas andando, eu perdido procurando...eu achado e perdido.
Se você quer saber, a alma está pronta para ser lisa novamente, passada a ferro e esticada como roupa encharcada no varal. A garoa não me molhou o suficiente.
A saudade sim, minhas flores artificiais permanecerão...mas, meu amor esse é de verdade!
Aos meus pais, ao meu irmão, ao seu caderno de desenho...TE AMO!

De ti!



De ti!

Tal qual poema livre em grandes palmeiras, coqueirais e seus cabelos negros, revoltos e sensíveis pediam um toque, uma mão carinhosa e as minhas as escolhidas. Mãos de homem em contato com seu ser, com sua mais profunda necessidade de carinho e meninice.

Dos passos que demos e que não percebestes, ritmados e em harmonia, as palavras sendo ditas de maneira mansa, compreendida, cheias, cheias de vida e olhares escuros e de mel se entredizendo, como se não bastasse seu sorriso e seus lábios.

Na mais gostosa chuva fina, cálida, refrescante...caminhamos, idealizamos símbolos, abrimos comportas, deixamos fluir tamanha calma e imensa ternura, como dois amantes calmos que se querem com ternura, que não atenua ou disfarça o desejo nem de um nem do outro, simplesmente apazigua o fogo do querer rápido e que foi tão bom.

Não havia tanto sol, mas, para quê afinal? Se dois seres celestes transitavam pela orla da praia, Lua e Marte de mãos dadas, um ensinando o outro a arte do querer, do amar e do ser pleno mesmo que ainda semente, mas, semente dura de vontade, consistente de amor. 

Que seja eterno, sempre, porque para a Lua será, em constante mutação enquanto Marte espera pelas suas fases e ama devagar, quase que dançando ao seu próprio luar e gosta, gosta disso como se fosse sua salvação. A sua grande mão chegou, a mão mais afagante, mais carinhosa, a que toca os lábios nunca em vão...a que sabe onde o caminho começa e termina.

De ti, lembranças se acumulam, dos olhos escuros, do sorriso claro, dos cabelos negros e rebeldes que cismam em ficar pra cima, emoldurando sonhos que dançam entre si.

Tu és Marte, sua Lua te espera mesmo na minguante, se permite na cheia, se entrega na crescente e nunca morrerá porque será sempre nova.

De ti, somente a voz me permite te lembrar, somente a lembrança da voz, da voz, e dos beijos, e dos xeros, e dos toques, e do amanhecer e do dançar apegado a mim. Pura decisão de enfiar tua língua na minha boca, e de caminhar de mãos dadas, de ser puxado para o centro, de ser tão teu que como nunca foi a Lua de outro alguém. 

De ti, só de ti!

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Eu vi um menino correndo!



Eu estava ouvindo essa música cantada por Gal, ouço desde rapaz e acho uma música cheia de simbolismo e vida, de esperança me parece.


Toda as vezes que se repete a estrada sob o sol eu me imagino nessa estrada, solitário, olhando bem lá longe no horizonte a poeira cantada, longa essa estrada e a poeira não parece baixar nunca.


Me enternece me imaginar o menino correndo, olhando o tempo, brincando ao redor dos caminhos, eu vejo outros meninos ali, como eu...eu te vejo, eu te vejo.


E hoje tantos anos, a distância do tempo, do espaço e da já enorme saudade me movimenta, me areja, a poeira já começou a baixar, a boca ainda está seca, o menino talvez dorme.


Dorme um sono profundo, pisado, ainda esperando ser revelado...doído. Uma tênue linha de vida ainda reluz e nesse laço eu vou me amarrando, no abstrato, no mais concreto objeto do amor que alguém pode se equilibrar, não, não despenco ribanceira abaixo como nos outros tempos, agora eu já me equilibrei e as palavras ditas, mal ditas, e imperfeitas já se foram na poeira.


Um olhar sobre o outro, que sofre, que chora, que ri, que dança nu na chuva, na luz que irradia por si, pelo sorriso, pelo deboche, pela beleza de si como ser ainda em formação de carne, mas, completo em espírito. Esse eu amo!


Podem romper a barreira de lodos, que eu criei asas e tudo pra mim será somente como uma flor de lótus, que no meio do pântano, da lama floresce. Sou ainda coragem e sou ainda metade porque não cheguei ainda a ti, mas, será assim uma eterna inspiração para alegria, para a loucura e para a fortaleza que sobe de nós.


Eu também ouço as estrofes e repito, eu canto e mesmo rouco eu ainda consigo atingir a maior nota, a do suspiro, a do respiro e coloco meu peito para arder. Seja lá o que tiver nessa fogueira, e isso pouco importa porque já me atirei.

Nas artes em geral, posso esculpir com a luz do Sol, posso pintar a poeira, posso tingir a estrada com a cor e com a tinta que eu quiser, e só eu saberei as cores que irei usar, te copiando!


Posso tingir também todas as estrelas de purpurina, por que não?

E esse menino de lá, da música, da estrada, continuará crescendo ou não...deixe o tempo saber.


E  os dois meninos irão pela estrada, na distância da idade, somente o amor pode igualar!

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Entre as costelas!



Estão todos na trincheira, esperando que com minha coragem e minha bala de perdão perfure suas costelas. Mas, não há. Não há balas, nem perdão, não há nada a perdoar ou perder. E continuam lá, fazendo rondas, esperando que eu me desarme e diga sim, diga sim, diga sim e diga sim de novo.

A fonte secou e as balas sumiram, derreteram ou simplesmente nunca existiram. 

Calmamente retiro minhas roupas e nu, sem nenhuma chance de retorno eu dou as costas. E vou, sigo adiante, passo por passo e olho com olhos de calma os movimentos atrás de mim...como se tivesse olhos nos ombros ou longas antenas vibratórias. Estão todos estáticos, da mesma forma que sempre foram, esperando que a comida chegasse na mesa no mesmo horário todos os dias, na mesma temperatura e no mesmo sabor, embriagados de rotina.

Quando me dei conta estava a muitos passos longe, logo me recuperando das minhas necessidades, cicatrizes fechando, a bala da permissividade tinha deixado um rombo no meu peito, agora aos poucos ia se fechando aquele buraco enorme, e meu coração batia novamente como se fosse um novo, novíssimo corpo extra que me deram.

Muita ânsia me deixando atordoado, sem rumo mesmo...mas somente numa direção, para a liberdade de ser, criatividade imensa de poder olhar com meus olhos, beijar com minha boca e dizer tantas coisas que eu sempre quis. Nada me colhe mais, nenhum ramo será cortado, nenhuma folha será arrancada da minha arvore sem que eu permita. E se isso novamente acontecer é por que eu ainda não finquei raízes em mim.

Me coloco em um pedestal, me converto em sinal, em luz própria. Nada de abismo entre mim e eu mesmo, sei que sou perfeito na ponta dos meus dedos que me percorrem sem medo.

E mais uma vez a certeza me invade, e a bala da coragem atirada em direção às costelas expostas explodem em estilhaços, queimando a porta que trancada eu deixei por tantos anos, por tanta gente, por tantos ninguém.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Tanto querer e outros afazeres!

EU QUERIA:


Eu queria ser Clarice, eu queria ser Caetano, eu queria ser Ro Ro. Eu queria ser Portinari, eu queria ser Malfatti eu queria ser robô.


Eu queria ser Marylin, eu queria ser Monteiro Lobato, eu queria ser Victor Hugo ou talvez queria ser Mozart.

Pessoa, não estava...tinha saído com seus...


Eu queria ser Cazuza, Renato Russo e Zeca Baleiro, eu queria ser Carpinejar eu queria ser só inteiro.


Eu queria ser alienado, Nietzsche não se queixou, eu queria ser Proust, Virginia não deixou.


Eu queria ser Michael Jackson, Madonna ou Andy Wharol.


Eu queria ser Drummond, Quintana, Veríssimo...eu queria ser de cada um a metade...ser inteiro.




FOTOGRAFIA 1


Olhe bem, preste muita atenção essa foto foi tirada e guardada para você. Não tem dedicatória, é só uma boa lembrança, e pode perceber não tem data, continua só uma lembrança.
Veja se consegue, veja se percebes, note se estou lá, pra você!
Consegue notar lá  o meu coração pulsando? Olhe mais, veja mais perto...ouça estou dizendo lá no fundo da foto...te amo!


FOTOGRAFIA 2


Não gosto, não tenho paciência, nada de momentos, nada de selfies, nada de comidas, nada de monumentos.


CORES


Eu gosto muito, devem achar que sou cinzento como meus cabelos. No entanto ao olhar pela janela do meu quarto vejo uma imensidão de cores, matizes amplas de verde, lilases que não podem ser profundos, vermelhos carmim, amarelo amansado de um dourado quase dormindo. É uma alegria, o sol bate em cada uma dessas cores e me parece um arco íris de ramos. Ficaria aqui admirando, mas, minha alma cinzenta me avisa que já é noite.


NÃO ME DIGA


Não me digas que não me aprova, que me reprovas, que sou tonto ou coisa igual. Sou eu na mais pura essência, sou EU AO NATURAL.


Sim eu sei, me confundo as vezes, leio mais de um livro ao mesmo tempo, temas variados, personagens desencontrados, personagens que se misturam, outros morrem quando deveriam vencer outros vencem quando deveriam morrer.


EXTREMURA


Dizem que a sensibilidade é fraqueza. O que seria do mundo sem as pessoas sensíveis para carregarem consigo e suportar as mazelas do mundo e dos seres que aqui vagam? Pergunto.


PREGUIÇA


Estava de preguiça, um dia sem inspiração. Meu diabo saiu ligeiro, partiu para seu surf de calção...meu anjo foi para a quadra da escola de samba com sua fantasia de capeta. Que confusão.


PASSARINHO DAS MIGALHAS


Espalhei algumas migalhas de pão para ver se pelo menos o pobre e desconfiado passarinho se chegava. Nada, o bichinho era marrento...desconfiado. Virei as costas fingi que partia e ele me olhando de soslaio fingia. Era um passarinho tão pequeno com olhos de dragão.



quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Crônicas de uma vida perturbada...do nascimento à morte e pós morte de B.T.




B.T nasceu sem muita vontade, como ele mesmo se sentia e sua mãe estava entregue à dor e com muito esforço, no entanto para ele isso era parte da sua eminente vida fora e nada de fazer tanta celeuma, ainda estava decidindo se iria ou não chorar para mostrar que estava ali, quase presente. Ouviu alguns gemidos de alivio e saiu, não enxergava nada, mas entendia tudo. Nasceu B.T, sem coragem, sem esforço e sensível a tudo o que rodeava. Nasceu no tempo normal, sem delongas, tudo certinho, sem contratempos. Meio cruel esse tempo todo, foi deixando o tempo passar e sem esforço.
Seu primeiro choro foi de raiva, mais do que pela batida do medico para força-lo a fazer parte desse mundo que ele já pressentia nada amistoso. E foi seguindo devagar para um lugar quentinho e estranho, já suava. Ficou esperando os próximos passos, o que esperar?
Nada que ele não pudesse vislumbrar através dos seus olhos embaçados ainda. Foi se preparando ali mesmo, já conseguindo decifrar alguns pontos cruciais na sua sobrevivência, se entregou ao amor da sua mãe, seria estupidez ou ela realmente velaria por ele? Descobriu devagarinho o que era esse sentimento, apaziguador, faminto e completo. Sentiu sua primeira cólica e chorou.
O que seria aquilo tudo misturado à ânsia de saber que já não guardava mais nenhuma lembrança do que tinha se passado anteriormente, como um ciclo interrompido, descartado e descaradamente desfrutado quando permitido. Agora seria mais um inocente e estúpido ser a escolher sem pressa obviamente qual destino tomar, prosseguir infante ou ser um desses seres que a vida sempre arrebenta. Tinha tanta escolha, que perturbação decidir isso agora, já que a volta ao calor de alguma coisa estava próximo. Não adivinhava nada e nem queria, só precisava estar ali e com seus objetos inalcançáveis. Perdoava a todos pela intromissão em sua tenra e crua vida, despreparado e sem vontade de prosseguir, foi empurrado mundo afora e agora? O tempo ainda estava a espera dele como se isso não bastasse para fustiga-lo de mansinho e ordinariamente ele se incumbia demoradamente de degusta-lo. Sensato desde os primeiros momentos, não via e não havia nele mais nenhum propósito a não ser o de viver. Iria averiguar se depois de tanto tempo lá naquele final que ele já antevia se tudo teria dado certo? Mas, como saber o que era o certo, o errado? Os objetos ainda continuavam crus e mansos, manchados de cores indecifráveis e secos, ao se aproximar não conseguia definir, já que os cheiros, os tatos, os sentidos ainda estavam amortecidos pela fina camada de vida que ainda o sobrepunha. Não demorou e sentiu nova cólica, que dor...primeiro contato com o mundo externo. Pensou logo em dar um fim nisso, e não foi capaz...chorou novamente. Tal qual um desgosto, iria permitir e permanecer, seguir assim? Nada disso, eu posso cuidar de mim e dos objetos inanimados que estão a minha volta, isso tudo é meu...adormeceu!
Acordou pelos sonhos bons que teve, um pouco apaziguado, já conseguia transformar algumas sensações e eram tão medíocres essas em imagens surreais. Constatou e confirmou estar fora da vida, e mesmo que ela o sobrepusesse finamente, olhou com olhinhos embaçados e cismados, as grades, grades daquele lugar em que eu passivamente permanecia imóvel, enrolado em algo quente, absurdamente quente, como um invólucro macio e inimigo ao mesmo tempo, sentia um calor infernal, sua temperatura corporal não era normal, era mais quente e iria carregar isso até os fins dos seus dias, e começou a sentir um mal estar, a cabeça doía, talvez pela passagem em um caminho estreito e desajeitado. O tempo todo iria atormenta-lo essa terrível dor de cabeça, transformada em fantasma, penumbra insólita que ele não iria cavalgar----sendo, assim, tomou como seu o espaço ínfimo, as grades, o cobertor, a manta aquela casca irritante e desprezível que o cobria e cuspiu, grunhindo baixinho e chorando. Sua arma secreta de vingança contra a burrice de um ser superior que nos dá a palavra tão erradamente e tardiamente.
Percebeu aí então, que sua arma mais voraz e mais mesquinha seria o choro, esse o choro, o chorão, o choramingo, o grunhir altinho, seria assim---prematuramente perspicaz. Tornou-se manhoso e choroso por longos anos, até se vingar das suas lágrimas que secariam, tão logo reconhecesse o amor. Isso após somente alguns anos mais tarde.
Se restabelecia a cada dia, e cada dia novas emoções e sensações, e cresceu desengonçado, desgovernado e sem rumo, atrapalhado e imensamente inteligente, captava como uma formiga mutante, uma abelha sazonal e zuenta tudo o que lhe parecia interessante, o desinteressante ele não sabia, somente ignorava. Por ele, tudo se movia, e achava que o mundo lindamente lhe pertencia, com seus objetos inanimados e inadequados se convertia em uma única peça, a mais brilhante e a mais engraçada de todos, porque andava e agora sorria, uma criança como outra qualquer, tirando aquela dor de cabeça miserável que lhe tolhia algumas tolices e permanecia sem permitir que ele se esquecesse dela angustiadamente e corria dali, e de lá, e com graves mas nem tantas consequências assim ele delimitava novamente seu espaço, as primeiras palavras tardaram, somente agora aos cinco anos expressou o que via, e pediu água.
Água em monossílabas, tão poucas, tão ásperas e tão delicadas, iria usar as palavras para se salvar e nisso continha uma verdade que ele já determinava em sua língua e em sua cabeça pasmada de interrogações. Aprendeu que falar podia estender sua percepção até que se ateve à mudez, com medo das palavras, com medo desse dom ignorante, pediu água novamente e se calou por bons anos. Não quis dizer mais nada, somente essa palavra tão seca poderia ser emitida, mesmo ele sabendo que nela permaneceria mudo e observador. Aos cinco anos, tão precoce observador, ignorado e investigado por muitos, ele observava junto com tudo e ao mesmo tempo a tentativa frustrada da palavra dita no dia a dia, desperdiçada como aquela gotinha de bebida deixada na mesa do centro da sala, tão grande, enorme, enraizada e traiçoeira.
Por alguns anos permaneceu mudo, sabia de cor tudo, todas as palavras, sílabas, cismado com os objetos ainda inanimados, se perguntava quando criariam vida---talvez? Sem respostas e sem muita pressa ele foi aguentando até explodir em um dicionários redondo de palavras ditas em sequencia, em ordem, em consonância com os assuntos e surpreendeu a todos os ouvintes, já tinha dez anos.
Dez anos, puro lirismo, infância bruta, louvada e fulgas, permaneceria imóvel até que aqueles antigos momentos fossem apagados da memória, muita pouca coisa permaneceu, os sonhos, o calor, as dores de cabeça e agora a ranhura das palavras, que ora falada, ora escrita se impunha. Dos dons que Deus lhe concedera, prevaleceu a estupidez. Idiota também, nem sempre alcançava com louvor suas penas, suas dores e muito menos suas alegrias. Notava que algo diferente o possuía, como um pedaço de pau enfiado em suas orelhas pudessem fazer uma conexão com o ermo e longínquo espaço de Deus. Ele começava a se perguntar se as orações que fazia duramente na igreja eram lançadas em espasmos ou seguiam em linha reta até alcançar as asas e afins.
Foi assim, cheio de imaginação, de conteúdo, de esvaziamento permanente que ele foi se contradizendo e deixando rastros perturbadores para trás. Sua temperatura perdida entre os dedos considerada invasiva percorria agora outras regiões do seu corpo, ele se descobria como homem e ser inanimado também. Fez quinze doloridos anos, corpo em evolução, mente em desgringolar e rolamentos e compressores o amassando e tirando dele um sumo tão esvaziado que não daria para cobrir a própria cama que o queria sempre.
E ele tinha preguiça, de levantar um dedo, de desdizer-se, de auscultar seu coração, imberbe, andrógino e imperfeito, começava a latejar sua cabeça e seu sexo. Tinha consciência da sua insignificante amplitude e derretia-se sempre por si mesmo---não bastava, ele mesmo? Não poderia se possuir como se possuía e sobrepujava seus desejos tão tépidos e ao mesmo tempo torpes. Não considerava que o outro fosse ele igual, ninguém seria como ele, ademais, a ranhura que sentia em sua garganta e falanges era como um desossar de almas, de caroços de azeitona do almoço e nada poderia ser como antes, nem depois, nem através das grades do monumento nem através das cruzes da sua igreja predileta naquele bairro tão distante. Carregava crucifixos em seu pescoço, pendurado aos montes em seu cordão. Perdeu alguns, juntava como obsessivo pela simbologia e esperava nisso uma salvação. Doía sua cabeça agora.
Levantou, levantou calmamente...aliás havia percebido que ele era lento, devagar, quase insosso, sem raios a lhe percorrer o corpo.
Se possuiu aos trinta e três, começou nova vida, e foi feliz, foi ficando feliz, se tornou feliz, embranqueceu o cabelo, tingiu as paredes do quarto de vermelho, possuía um espelho e nele sem reflexo, perplexo percebeu...era outro. Podia se dizer que era ele mesmo? Não se media a tanto tempo, não se via nada. Doou-se para os filhos, suas crias e lindas criaturas e sempre amou igual, ao seu igual e permaneceu assim por longos quinze anos.
No mais, aos cinquenta já entorpecido e desiludido redescobriu que amar não tem preço, rotulo e nem idade. Preferiria viver muito, se amou demais contemplando o tempo tão mais devagar que suas retinas estavam congelando, mas, ele vibrava ao mesmo tempo, encontrando sempre no seu centro um céu de ar, por e dor...tirava lustres disso, e empacotava toda a esperança no mesmo cantinho que acumulava suas coisas de cinquenta anos. Podia e se sentia amado e desejado. Trabalhava arduamente, como se isso o retirasse da sua enorme inexatidão, era uma mola propulsora que pulsava, pulsava, pulsava...parou!
Morreu e foi delicioso, partiu cedo e ele estava já feliz pela partida, nem sentiu, nem chorou, foi a mesma sensação dos trinta e três, libertação total. Nem sentia que era alma penada ou coisa assim, se sentiu desossado novamente e leve. Nada de creme antirrugas, nada de academia e nem mesmo o cabelo ralo o incomodava, aliás, nem tinha mais cabelo, era um fantasma disforme, sem uniforme e feliz da vida nem notou que não tinha mais sexo...que libertação ainda mais total. Tentou se tocar, fumaça, ectoplasma, catarro algo assim fluído e transparente. Ficou grudado na parede, era agora somente um retrato.